quinta-feira, 22 de julho de 2010

O Meu Encontro com o Capitão Pansau Intchama (Blog Didinho)


Foto: Pansau Intchama, diz ter estado em casa de Nino Vieira com o Actual Chefe do Estado-Maior General António Indjai na noite em que o Ex-Presidente foi morto. (didinho.org)

Por Fernando Jorge Casimiro
Artigo publicado no blog: Didinho

NOTA: O trabalho que hoje apresento é fruto duma conversa entre 2 guineenses sobre diversos assuntos do país, particularmente, sobre as matanças de 01 e 02 de Março de 2009. Pode causar transtornos aos guineenses, pode até, provocar "tempestades" na Guiné-Bissau, mas deve ser apresentado, para que, quem de direito, utilize da melhor forma o que nele consta, agindo em conformidade com a Lei, em nome da Verdade e da Justiça, afim de se acabar, de vez, com a impunidade na Guiné-Bissau!

Semelhanças

"No passado dia 1 de abril de 2010, um grupo de militares dirigidos por mim, viu-se obrigado a tomar medidas com vista a pôr ordem nas Forças Armadas, porque a forma como a classe estava a ser dirigida, iria culminar num conflito iminente. O Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, Vice-Almirante José Zamora Induta, conduzia o Estado-Maior como se fosse a sua propriedade pessoal, tomando sobre si toda a administração da mesma." António Indjai, criminoso (golpista, assassino e facilitador de narcotráfico), actual Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau.


A introdução acima reproduzida "Semelhanças" e que é a mesma da queixa-crime movida pelo actual Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau, António Indjai, contra o seu antecessor e superior hierárquico, José Zamora Induta, poderia servir (encaixa perfeitamente no mesmo cenário), para anunciar e justificar o assassinato do ex-Presidente da República, General João Bernardo "Nino" Vieira, ocorrido na madrugada de 02 de Março de 2009, horas depois de um outro assassinato, o do então Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, General Tagme Na Waie.

Encaixa-se e bem, se fizermos a seguinte "montagem": "No passado dia 02 de Março de 2009, um grupo de militares dirigidos por mim, António Indjai, viu-se obrigado a tomar medidas com vista a pôr ordem no país, porque a forma como o Estado estava a ser dirigido, iria culminar num conflito iminente. O Presidente da República, General João Bernardo "Nino" Vieira, conduzia o país como se fosse a sua propriedade pessoal, tomando sobre si toda a administração do mesmo, tendo chegado ao ponto de mandar matar o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, General Tagme Na Waie , o que motivou a nossa pronta resposta que culminou também na sua morte..."

Na passada sexta-feira, 16.07.2010, no meu trajecto por Mafra, encontrei-me com o Capitão Pansau Intchama. Não o conhecia pessoalmente, mas como falamos por telefone várias vezes, encontrando-se ele nesse dia em Mafra e estando eu de passagem, proporcionou-se um encontro, há muito desejado.

Tive conhecimento de que Pansau Intchama se encontrava em Portugal no dia 04.04.2010 e desde então, temos falado por telefone com alguma regularidade.

A 12 de Dezembro de 2009 escrevi um texto intitulado "A PULSEIRA...", no qual relatei o que em Bissau se tem dito sobre a sua participação no assassinato do ex-Presidente da República, o General João Bernardo "Nino" Vieira. Fiz questão de lhe dizer que tinha escrito esse artigo e ele tranquilamente respondeu: "Sim, é o que se diz por aí...".

Pansau Intchama é um jovem, nascido em 1979, bem disposto, muito lúcido, que denota muita preparação psicológica, fruto da sua formação militar. Não é fácil conseguir obter dele informações precisas que a ética e a disciplina militar impõem como assunto estritamente de ordem militar.

Por diversas vezes tentei "sacar" dele informações e confissões sobre as matanças de 01 e 02 de Março de 2009, mas também, sobre o envolvimento das altas chefias militares e outros, no narcotráfico.

"Sabes, sou militar, sobre essas coisas não falo...". Respeitei sempre a sua "recusa" em falar, mas na sexta-feira, 16 de Julho, dia em que concluiu o Curso de Promoção a Capitão de Infantaria - CPCI - Curso General Luís Augusto F. Martins, realizado em Mafra de 11.01.2010 a 16.07.2010,
consegui saber algo mais do que sabe Pansau Intchama, considerado testemunha-chave, a par de Isabel Romano Vieira, do assassinato do ex-Presidente Nino Vieira.


Pansau recebeu-me no jardim em frente à Porta de Armas da Escola Prática de Infantaria, aí conversamos um pouco e depois convidou-me a entrar para visitar a EPI.

Pude constatar que conhece os cantos à casa e que é bem tratado por todos. Fomos ao bar beber qualquer coisa e de seguida, fez questão que jantasse com ele. Surgiu no entanto um outro militar timorense que tinha frequentado o mesmo curso que ele e jantamos os 3 .







Foto: Didinho na companhia
do Capitão Pansau Intchama,
EPI, MAFRA. (didinho.org)











Continuamos a falar da Guiné e dos militares; da necessidade de os nossos militares frequentarem cursos de oficiais e outros, no âmbito da capacitação dos recursos humanos em particular e da modernização das nossas Forças Armadas em geral.

Terminado o jantar, dirigimo-nos para o quarto onde está instalado e que partilha com um militar cabo-verdiano, do mesmo curso, com quem também falei.

Pansau ligou o seu portátil e mostrou-me imagens fotográficas e vídeos do seu casamento, realizado em Janeiro deste ano, dias antes de viajar para Portugal afim de frequentar o curso de promoção a capitão de infantaria, curso este proporcionado pelos acordos de cooperação militar entre Portugal e a Guiné-Bissau e abrangente a outros países da CPLP.

Foi o António Indjai quem fez questão que eu me casasse antes de viajar para Portugal, disse-me ele, acrescentando que foi assessor de António Indjai durante 7 anos!

Na verdade, ele tinha-me como um filho!

Das muitas imagens que vi, pude concluir que Pansau Intchama era (até Janeiro de 2010) muito estimado pelas chefias militares.

Pude ver no seu rosto, muita ansiedade, reflectindo, naturalmente, saudades da família que se encontra em Bissau: a esposa e os seus filhos, um casal de gémeos.

Então Pansau, sempre voltas para a Guiné-Bissau, mesmo sabendo que corres risco de vida, por tudo o que se tem dito a teu respeito? Questionei-lhe mais uma vez, a ver se lhe conseguia surpreender e obter algo que me ajudasse a juntar mais dados sobre o que penso e já escrevi em relação às matanças de 01 e 02 de Março de 2009.

Sim, estou disposto a regressar e já agora, faço questão que saibas que, contrariamente ao que dizem na Guiné, não fugi e, se estou em Portugal, isso é do conhecimento das nossas autoridades, pois vim fazer especialização desde Janeiro e o levantamento militar aconteceu a 01 de Abril.

Para confirmar-te que as nossas autoridades sabem onde estou e o que vim fazer, vou telefonar agora mesmo ao General António Indjai e vais ouvir a nossa conversa.

Telefonou, no modo alta-voz e pude ouvir, do outro lado da linha alguém atender.

- General, i ami Pansau! General, sou eu o Pansau!

Ah, Pansau, cuma ku sta?! Ah, Pansau, como é que estás?!

Pude ouvir a voz do António Indjai, tal e qual a da gravação contendo as ameaças proferidas no dia 01 de Abril passado. Porém, desta vez era uma voz calma, muito calma mesmo.

Da conversa tida entre eles, o Capitão Pansau Intchama fez questão de dizer ao actual Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, António Indjai que, tal como lhe dissera há cerca de 1 mês, o seu curso acabava e acabou nesse dia, 16 de Julho e que, por isso, aguarda o Bilhete de passagem de regresso ao país, sendo que, já não tem direito a ficar alojado nas instalações da EPI, pois a sua formação tinha chegado ao fim...

Do outro lado, o General António Indjai respondeu mais ou menos desta forma: "Tem calma, o Ministro vai resolver isso, tens que aguardar. Olha, os teus colegas que estão em Angola a receber formação, estão bem piores e até choram..."

Aguardar até quando, General? Perguntou Pansau Intchama, para a ligação terminar aí...

Se dizem que sou criminoso, então que me enviem o bilhete de passagem para eu regressar e ser julgado pelos crimes que me acusam, disse-me de seguida Pansau Intchama.

Afinal, por que razão os deputados guineenses e outras autoridades nacionais continuam a afirmar desconhecer o paradeiro do Capitão Pansau Intchama, ele que chegou a ir à nossa Embaixada em Lisboa tratar de assuntos pessoais?!

Afinal, por que razão algumas vozes acusam Portugal de dar protecção ao Capitão Pansau Intchama, quando, na verdade, todos sabem desde quando Pansau Intchama saiu da Guiné, com destino a Portugal e, ao que veio...

Confrontei o Capitão Pansau Intchama com notícias publicadas em diversos órgãos de Comunicação Social, dando conta de que o Procurador-Geral da República, Dr. Amine Michel Saad estaria interessado e empenhado em ouvi-lo, por ter sido considerado testemunha-chave do assassinato do ex-Presidente Nino Vieira.

Levantou-se e foi buscar 1 exemplar do Semanário "Última Hora", Edição Nº 89, de 16.06.2010, publicado em Bissau, que fala precisamente sobre o assunto.

Pansau Intchama, pelos vistos, está bem informado e documentado sobre o que se diz dele.

Talvez abalado por tudo isso, se tenha deixado embalar na conversa que fui puxando até chegarmos ao seguinte:

Pansau, onde estava António Indjai na madrugada em que o ex-Presidente Nino Vieira foi assassinado?! Perguntei.

- Hum, onde achas que devia estar?!

É assim Pansau, acusam-te de seres criminoso, de teres participado na morte de Nino Vieira, sabem que estiveste lá, mas certamente, digo eu, não estavas sozinho...

Olha, sou militar, como militar respeito os meus superiores e cumpro as suas ordens.

Estávamos, estivemos todos em casa do ex-Presidente Nino Vieira nessa noite. O nosso Comandante era o António Indjai. Um militar cumpre ordens do seu superior hierárquico...

Por que não falam do Major Tcham Na Man, questionou, dando a entender que foi este oficial, aliás, referenciado na altura, quem teve maior participação na morte de Nino Vieira.

De seguida, disse-me: Se não fosse a minha pronta intervenção, o grupo de militares que aí estava teria violado a esposa do Presidente! Eu é que a tirei das mãos deles e disse-lhe para ir embora, ao que respondeu: obrigado nha fidjo. Obrigado meu filho.

Que relação existe entre o duplo assassinato de Tagme na Waie e Nino Vieira, perguntei.

O assassinato de Tagme Na Waie, tem a ver com o narcotráfico, com os aviões que até hoje estão no aeroporto de Bissalanca...

Mas isto quer dizer que, as disputas provocadas pelo controlo do narcotráfico, entre Tagme Na Waie e Nino Vieira ditaram a morte do Tagme e que de seguida houve um aproveitamento estratégico de pessoas interessadas na tomada do poder e que incitaram os militares a vingarem-se, assassinando o ex-Presidente Nino Vieira, por, alegadamente se atribuir a ele a autoria moral do assassinato de Tagme Na Waie?

(...)

Olho para as horas, já tínhamos esgotado 3 horas de conversa. Tinha registado o essencial de tudo quanto o Capitão Pansau Intchama se disponibilizou a dar a conhecer.

Disse-lhe que tinha sido muito frutuoso o nosso encontro e que estava na hora de ir para casa.

Acompanhou-me e ainda fomos beber algo já fora das instalações da EPI, mas sempre a falar de assuntos da Guiné-Bissau.

Hoje fico por aqui, amanhã há mais...

Próximo capítulo: O QUE É QUE ESTÁ NA BASE DO LEVANTAMENTO MILITAR DE 01 DE ABRIL

Por Fernando Jorge Casimiro
Artigo publicado no blog: Didinho

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