segunda-feira, 11 de março de 2013

Água e eletricidade chegam a aldeias isoladas na Guiné-Bissau

A 120 quilómetros de Bissau, em aldeias quase inacessíveis, decorre uma revolução silenciosa que está a mudar a vida de 15 mil pessoas. Energia solar leva luz a quem nunca teve, leva água perto a quem a tinha longe.

São tabancas (pequenas aldeias) como as de Culcunhe ou Unfarim, como Sansabato ou Maque, perto de Bissorã, região de Oio, que estão a beneficiar de um projeto concebido pela organização não governamental ADPP (Ajuda ao Desenvolvimento do Povo para Povo), financiado pela União Europeia e concretizado pela Impar, uma empresa da área da energia.

Uma união de esforços que começou em novembro passado e que em quatro anos vai dar qualidade de vida a 24 aldeias de Oio, iluminando pouco a pouco escolas, centros de saúde e centros comunitários, e trazendo água para consumo e para rega através de furos, bombas e torres com depósitos.

É um pequeno painel solar a mudar a vida de pessoas como nenhuma mudança política em Bissau mudará, dando luz para aulas noturnas, para partos à noite, para bombear água, para ver televisão ou carregar telemóveis (para muitos o principal benefício).

É por isso que na tabanca de Sansabato o imã Quimo Safé não se cansa de agradecer. "Ficamos contentes com a vossa presença, os mais velhos viram o que vocês trouxeram e não temos palavras para agradecer". Fala para a ADPP, fala para a Impar.

"Os homens e as mulheres da tabanca vão sempre recebê-los de braços abertos. Os homens da tabanca não tinham forças para fazer este furo. Se vissem onde as nossas mulheres iam buscar água antes iam ter pena", diz o imã ao lado da torre de água no centro da aldeia onde já só falta montar os painéis solares que vão servir a bomba.

A mesquita já lá tem um e o benefício é visível mas também audível. "Antes gritávamos e ninguém ouvia, agora com o microfone as pessoas já podem ouvir as rezas".

E à entrada da aldeia, junto da escola, Braima Camará, responsável de tabanca, diz que o painel permite ter aulas à noite e acabar com o analfabetismo. Todas as noites 20 mulheres e 10 homens têm aulas, das 20:00 às 23:00.

"Estamos muito contentes porque antigamente não tínhamos luz mas neste momento a tabanca está feliz, toda a área, a mesquita, o centro de saúde, a escola, todos têm luz", diz Baima Camará.

A distância entre tabancas não é grande mas demora-se horas a percorre-la, por caminhos que na época das chuvas são ribeiros, quando o isolamento é maior. Ao lado de Sansabato, na aldeia de Maqué a ADPP (na Guiné-Bissau há 30 anos) e a Impar estão a montar bombas para tirar água e fazer um sistema de rega gota a gota, tudo no âmbito do mesmo projeto, chamado "Clube de Agricultores".

Félix Fresnadillo, responsável pela área de energia solar e água da ADPP, explica à Lusa, no meio da horta, que o projeto compreende a eletrificação de 11 escolas, nove mesquitas e sete centros de saúde, além de 48 fontes com bombas alimentas a energia solar, 24 de água para consumo e outras tantas de água para rega.

Paralelamente é ensinado aos agricultores novas técnicas de cultivo e a melhor forma de aproveitar a água. E a ADPP, diz Félix, vai também fazer sete centros de produção, para que alguns alimentos sejam processados (descasque de arroz, óleo de palma e de amendoim) e comercializados.

E Félix lembra ainda outra valência do projeto: "nos centros comunitários, local de encontro para jovens e para reuniões, vamos pôr televisões grandes, para que as pessoas possam ver o que se está a passar no mundo".

É um novo mundo "servido" por Patrício Ribeiro, um português diretor da Impar que há 25 anos instala painéis fotovoltaicos na Guiné-Bissau, mais de 600 instalações até hoje, em aldeias perdidas no país na maior parte dos casos. Deverá ser quem melhor conhece o interior da Guiné-Bissau, arquipélago dos Bijagós incluído.

Em Cawal, junto de uma escola onde o professor Ângelo Gomes agora dá aulas noturnas a 45 alunos, Patrício Ribeiro frisa à Lusa que nas tabancas não havia nenhuma energia e que agora têm lâmpadas que ficam acesas toda a noite e que as mulheres e meninas podem aprender a ler (porque de dia têm de trabalhar).

O pequeno painel não precisa de manutenção e permite três horas de aulas por dia. No caso de Cawal está previsto também montar uma televisão com leitor de CD para cursos de alfabetização, explica.

Boné na cabeça e muitos papeis nas mãos, Patrício Ribeiro percorre tabanca a tabanca por caminhos inexistentes, mede terrenos, dá indicações. "Procuramos sempre comprar materiais fabricados na União Europeia e os fabricantes dão 20 anos de garantia", diz.

"A Impar já deu luz a muitos milhares de pessoas, estamos em mais de 100 centros de saúde e hospitais, em sítios onde ninguém chega a não ser as populações", garante.

Nas tabancas de Oio, entre Bissorã e Mansabá, é ele, com Félix Fresnadillo, a face visível de uma revolução que só não é mais silenciosa porque dá luz aos microfones das mesquitas. Quimo Safé reza por eles todos os dias.

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